sexta-feira, 20 de abril de 2018

O silêncio é meditação


José Gonzaléz Collado

O silêncio é meditação,

ao libertar-se da realidade corporizada por ruído, movimento, media, relações humanas, fenómenos externos, a mente inicia uma viagem sem destino. Por vezes a mente eleva-se no êxtase da contemplação de um quadro, na leitura de um livro, na audição de uma obra musical, ao admirar um edifício. Mas também na expressão de um olhar que nos ama, na pureza da expressão de um recém-nascido.

  O silêncio é trágico quando, sem palavras, acompanhamos um ente querido na agonia do seu ocaso na antecâmara da morte. O silêncio torna-se a forma mais excelsa de dignidade quando se está numa cama de enfermaria e se cala o sofrimento físico pois se sabe que a morte nos espera. O enfermo cala o seu desespero a um filho, por exemplo, animando-o a seguir o seu caminho e fazendo crer que a vida será o mesmo sem ele.

O silêncio pode ser aviltante e salvador. Perante a opressão e o risco de perder a vida, quantos não calam a sua consciência e a sua dor para poderem sobreviver?!

  Sendo aviltante pode ser digno – um indivíduo que ganha 500 euros por mês, mulher desempregada, contrato a prazo, cala sua indignação para poder sustentar a família.

  O silêncio é opróbrio e indigno – quantos se calam perante injustiças, infâmias, indignidades, apesar de não correrem qualquer risco. Quantos calam os valores que lhes foram transmitidos pelos pais, avós, professores, instrutores, mestre de loja, por preguiça, desinteresse, egoísmo, avidez, vaidade no dia-a-dia esquecendo o zelo indispensável no compromisso que assumiram!?

  O silêncio, sendo fundamental para iniciar a viagem interior, pode ser aterrador à medida que vamos descendo ao inferno dos nossos desmandos, escavando nossas convicções, esmiuçando pensamentos e enfrentando nossos defeitos ficamos mais distantes da aparência de realidade que compõe nossa existência. Os demónios que obscurecem nossa mente constituem um ruído ensurdecedor ao sobreporem-se à nossa convicção do que é a realidade. No silêncio da nossa caverna mostramos a nossa coragem ao enfrentar nosso maior inimigo. Essa batalha será eterna e o silêncio será a nossa arma mais eficaz. O silêncio libertará nossa alma para a demanda da palavra perdida e tornar-nos-á companheiros da consciência universal.
ELBF04

1 comentário: