“O Silêncio”
São inúmeras as variantes de significância e os
contextos em que se usa profanamente a palavra silêncio (silentium), estado de quem se abstém
ou pára de falar, cessação de som ou ruído, omissão de uma explicação, sossego,
quietude, calma, segredo, sigilo, expressão, usada, para impedir de falar ou pedir
que alguém se cale.
O silêncio e as suas interrupções é uma constante das
nossas vidas, desde o nascer do bebé – que irrompe do silêncio do ventre
materno, até ao silêncio do velho – ao partir e renascer para a espiritualidade.
É também uma constante do Universo e de toda a existência – o silêncio do
movimento perfeito dos planetas em harmonia consigo mesmo e com o firmamento –
o silêncio do vácuo que interliga as galáxias…
Podemos pois compreender, com segurança, que o
silêncio faz naturalmente parte da vida de toda a criação, e de modo muito
especial da vida do Homem; aqui atingindo a sua plenitude quando tal silêncio é
consciente, positivo, humanizado, e orientado, podendo então expressar uma
universalidade de sentidos, dentre eles: compreensão; compaixão; reconhecimento;
humildade; autodomínio; paz; tranquilidade; harmonia; determinação; respeito;
aprendizagem; ordem; segredo; reflexão; meditação; abertura para a revelação;
progresso.
Todos estes sentidos dados ao silêncio, se bem
conduzidos, terão em si como que um denominador comum, a vontade do Homem se
superar dentro de si mesmo, extravasando para o exterior, e perante os seus
semelhantes, uma aprendizagem de gratidão pela vida e procura de novos
horizontes através do imenso poder da mente e do pensamento, tendo por intenção
a busca incessante da sabedoria e autoconhecimento que a todos aproveite.
Creio que a Maçonaria, enquanto ordem iniciática que
prima pela prevalência do espírito sobre a matéria, tendo por escopo o
aperfeiçoamento intelectual, social e moral da humanidade, e onde o todo é
enriquecido pelo somatório do enriquecimento individual de cada Homem – em
primeiro lugar perante si próprio, e como corolário perante os seus
semelhantes, não poderia cumprir os seus desígnios reconhecesse à aprendizagem
do silêncio e à sua boa orientação uma importância central no caminho do
desenvolvimento espiritual do Homem.
Posso hoje afirmar, de forma mais esclarecida, e por
isso ainda mais humilde – pelo conhecimento cada vez maior do infinito tamanho
do desconhecido, que urge que cada um de nós se empenhe e envolva no processo
de se encontrar consigo próprio e com a divindade que há em si, ainda que de
forma latente, e também em harmonia com a divindade do próximo e do ecossistema
em geral – o Universo, pois só dessa forma nos conseguiremos elevar na busca
incessante, e porém sempre inatingível, da perfeição – nisto consiste muito
sinteticamente saber ouvir a VOZ do SILÊNCIO.
Pode parecer contraditório, pois o silêncio é ausência
de som, de voz, mas não é de facto uma impossibilidade, e nem sequer é uma mera
metáfora; saber ouvir a VOZ DO SILÊNCIO (a voz do nosso silêncio) é um processo
que convoca, e leva para a grandeza da meditação e reflexão questões
como o que somos, de onde viemos, e para onde queremos ir – e não me refiro
apenas ao pedaço de matéria que cada um de nós é hoje – de forma efémera, mas
àquilo que somos e continuaremos a ser na nossa essência, e que desconheceremos
sempre em absoluto, mas que prevejo e acredito se vá vislumbrando melhor à
medida que aumentarmos, com compromisso pessoal e sem radicalismos, o nosso
investimento (o querer, e o fazer), para estarmos o mais perto possível da
busca incessante de harmonia com o GADU, nosso criador.
Ainda sem sabermos muito bem o que era, todos nós pudemos
experienciar o silêncio maçónico, desde logo, ab initio, na Câmara de Reflexão, quando éramos candidatos a
Aprendizes. E foi logo aí que o silêncio foi de Ouro, por nos ter permitido,
cada qual à sua maneira, ter a oportunidade, que porventura nunca tínhamos
tido, de meditação séria e de contemplação sobre o que somos, de onde vimos e
para onde queremos ir, fazendo-o num contexto próprio que nos ajudou a despir perante
os nossos futuros Irmãos e perante nós próprios, alguns dos muitos estereótipos
que nos subjugam no dia-a-dia. Podemos pois dizer que o silêncio de nós perante
nós mesmos nos ajuda a libertarmo-nos, a reposicionarmo-nos com igualdade
perante os outros, permitindo-nos assim almejar atingir o caminho da
fraternidade.
Seremos eternos Aprendizes; o silêncio será sempre o
mesmo; e porém tenho já a certeza que a forma como conseguimos ouvir a sua voz
dentro de nós, ou seja, o que cada um consegue retirar de útil do seu silêncio,
vai evoluindo à medida de que a sua mente consciente é alertada e despertada
pelos ensinamentos que lhe são revelados pela Maçonaria.
Produzir
este Balaústre, sob a inspiração da obra “A VOZ DO SILÊNCIO”, conforme sugerido
pelo nosso T:.V:.P:.M:. Agostinho Costa, foi um enorme privilégio de
aprendizagem – e de muito difícil descrição – quer ela sua magnitude, quer pela
curiosidade e pesquisa que motivou sobre a obra da sua autora, Helena Petrovna
Blavatsky, quer ainda, em especial, pela oportunidade de percecionar uma obra
que traduz ensinamentos poderosíssimos da civilização tibetana, mas que afinal,
tiradas as necessárias ilações são ensinamentos universais, revelados por todo
o mundo através das figuras que mais se vêm destacando ao longo da história
universal.
Quanto
ao conteúdo da obra “A VOZ DO SILÊNCIO”, seria impossível descrever aqui toda a
relevância do que percecionei, e certamente percecionei pouco, já que os
ensinamentos irão certamente sendo distintamente percebidos à medida que nos
desenvolvemos na compreensão da vida; sem prejuízo de outros, é porém merecido
que faça breve menção de alguns enfoques que nos devem despertar.
Cito:
“Para te tornares conhecedor da
Personalidade Total, tens primeiro de conhecer a Personalidade. Para chegares
ao conhecimento dessa Personalidade, tens de abandonar a personalidade à
não-personalidade, o ser ao não-ser, e poderás então repousar entre as asas da
Grande Ave.”
O
Universo é revelado assim como um caminho em direção à unidade; este enfoque é
também realçado mais à frente pela chamada “Heresia da Separação”, onde nos é
revelado que a separação entre nós pelo ar é uma ilusão que nos afasta, e onde todos
nós pertencemos (como de um átomo se tratasse) a algo maior de que fazemos
parte; algo que tem uma ordem maior, não entendível ao humano, dentro do seu
referencial de espaço e tempo, e muito menos o será sem a meditação interior
que lhe dê pistas de autoconhecimento.
“Porque quando para si mesmo sua própria forma
parece irreal, como o parecem, ao acordar, todas as formas que ele vê em
sonhos, quando deixar de ouvir os muitos, poderá divisar o UM – o sonho
interior que mata o exterior”.
É
pois ao mergulhamos profundamente na nossa vida interior que podemos vir a
perceber o quanto temos estado desligados de nós mesmos, e que tudo pode mudar
quando assim buscamos o mistério do nosso Eu e do Universo.
A
ideia das três salas, que também nos lembra o mito da caverna, de Platão, transmite-nos
três estádios do processo por que passamos na nossa tentativa de compreensão
sobre o Universo, e dá-nos pistas sobre os perigos de cada etapa.
Na
primeira sala (ignorância) a sobrevivência é o objetivo, com o maior conforto
possível e sem qualquer preocupação com o próximo; na segunda (a aprendizagem),
já começamos a evoluir mentalmente, mas não conseguimos as mais das vezes
deixar a vaidade e a soberba, ou seja o conhecimento vem como que impregnado
das motivações malévolas da afirmação do individualismo que podem levar à
petulância; na terceira sala, a da sabedoria, estaremos já num estádio em que
através do conhecimento poderemos vir a atingir ideais de igualdade, de
fraternidade, de compaixão e de compromisso, mas ainda aqui há o risco de nos
perdermos em egoísmos e egocentrismos que nos farão perder o rumo.
“Se queres atravessar seguramente a primeira sala,
que o teu espírito não tome os fogos da luxúria que ali ardem pela luz do Sol”. Alerta-nos para os perigos de compreendermos a
vida de forma meramente física.
“O
nome da segunda sala é a Aprendizagem. Nela a tua Alma encontrará as flores da
vida, mas debaixo de cada flor uma serpente enrolada”. Somos aqui alertados
para a ilusão da informação, que nunca é conhecimento e sabedoria, quando ainda
lhe falta a profundidade, e que nos pode levar por caminhos contraditórios ao
nosso Eu.
“…na Sala da Sabedoria, a sala que está para além,
onde todas as sombras são desconhecidas e onde a luz da verdade brilha com
imorredoura”; “Esta luz brilha na joia do grande enganador (Mara). Enfeitiça os
sentidos, cega o espírito e deixa o descuidado naufragado e sozinho”. Alertados somos aqui para o facto de a sabedoria
não se bastar a si mesma, ela é dinâmica e infinita e só ter real serventia se
foi constantemente mobilizada ao serviço do coletivo.
“Se, passando pela Sala da Sabedoria, queres chegar
ao vale da felicidade, fecha, discípulos os teus sentidos à grande e cruel
heresia da separação, que te afasta dos outros.” Somos aqui alertados para o egoísmo e para os seus
malefícios que resultam de acharmos que, por estarmos separados por um espaço
de ar entre nós, somos (ilusoriamente) entidades identidades distintas, e que
por isso o mal que façamos ao próximo não magoará também enquanto parte do
todo.
Muito
e muito mais haveria para dizer, como mera tentativa de ilustração sumária dos
ensinamentos que nos são revelados pela “VOZ DO SILÊNCIO”, o que é
manifestamente impossível, quer pela limitação deste balaústre, quer pela
grandeza da obra inspiradora, pelo que me resta agradecer novamente a
oportunidade de ter sido contacto com esta obra, da qual aconselho leitura, com
profundidade e interpretação à medida de cada um – é pois uma obra para reler
periodicamente, e ir retirando ensinamentos – o que farei com grato prazer ao
longo da vida.
ELBF09