quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

O SILÊNCIO

Albrecht Durer - 1514
O SILÊNCIO

No século XXI, especialmente nas grandes cidades, governadas pelo tráfego de veículos e por numerosas variedades de contaminação acústica o ruído reina. Este caos acústico procede do desenvolvimento tecnológico, especialmente no seu caráter portátil, pois hoje somos sempre acompanhados de dispositivos que nos recordam que estamos conectados, que nos avisam quando recebemos uma mensagem, que organizam os nossos horários com base no ruído, é neste contexto, que mesmo no plano profano, o silêncio implica uma forma de resistência, uma maneira de manter a salvo uma dimensão interior contra as agressões externas.
O Silêncio, é, pois, muito mais que uma forma de estar. É a expressão mais verdadeira e efetiva das coisas inomináveis. E a tomada de consciência de que há determinadas experiências para as quais a linguagem não serve, ou que a linguagem não alcança, é um traço decisivo do conhecimento e é também um dos princípios fundamentais da Maçonaria e uma das principais tarefas do Aprendiz Maçon. Afirmo ser uma tarefa porque como referiu Willian James, “O exercício do silêncio é tão importante quanto a prática da palavra”, ou seja, quase todos sabemos falar, mas poucos sabemos calar. O silêncio é, pois, uma virtude através da qual se faz o percurso da aprendizagem nos primeiros anos de formação maçónica. Podemos assumir que ao contrário do que se poderia pensar numa primeira análise, de que o silêncio é um condicionamento e uma restrição à liberdade de expressão do Aprendiz e do Companheiro Maçom, ele é na realidade uma ferramenta com a qual se exercita a autodisciplina e assim os Irmãos apreendem com mais intensidade tudo o que ouvem, veem e sentem. No silêncio, o Maçom dialoga consigo mesmo e, nesse diálogo, conhece-se melhor a si mesmo dessa forma potencia as suas possibilidades espirituais não como uma imposição de grau, mas, sim como uma virtude que alerta para a necessidade de nos prepararmos para o “Uso da Palavra”.
O tema do Silêncio, leva-nos a viajar no tempo, até ao dia da iniciação. Nesta importante, para mim a mais importante e bonita, cerimónia maçónica, o silêncio desempenha o papel principal da sessão, desde que somos vendados e levados para a câmara de reflexão e onde ainda profanos, a sós ou com os nossos futuros Irmãos gémeos, rodeados de símbolos, frases e palavras somos levados a desvendar o VITRIOL, e, portanto, a viajar internamente. Do mesmo modo, quando prestamos o nosso juramento, adquirimos a obrigação de estar em Silêncio, e de não desvendar os segredos, as palavras, nem os membros da ordem ao mundo profano. Aí o silêncio representa a discrição e a disciplina do Maçom, assim como a sua lealdade para consigo próprio e seus irmãos.
Após a Iniciação e já Maçom, o Aprendiz trabalha em silêncio, pois só assim é possível procurar a perfeição e dessa forma construir o seu templo interior cujos alicerces são os mais altos princípios intelectuais, morais e sociais que modelam o carácter. Não sendo uma tarefa fácil, o silêncio dota-nos da paciência necessária para a resolução de problemas e possibilitará escolher a palavra certa no momento em que estejamos habilitados para usar a palavra, com uma resposta inteligente, fraterna, livre e de bons costumes, como se espera ser a principal característica do obreiro Maçom.
Citando Fernando Pessoa, “existe no silêncio, uma tão profunda sabedoria que às vezes ele se transforma na mais perfeita resposta.” A sabedoria do silêncio é, pois, uma arte complexa, que não consiste somente em calar a palavra exterior, mas que se torna realmente completo com o silêncio interior do pensamento para que a Verdade possa intimamente revelar-se e manifestar-se na nossa consciência, isto significa que mesmo após ser exaltado a Mestre, o Maçom deve continuar a usar o silêncio como base de um trabalho contínuo de aperfeiçoamento, fazendo valer os princípios da circunspeção, da discrição, da disciplina e da tolerância. Apesar do Mestre Maçom adquirir o pleno direito ao uso da palavra, este tem que respeitar em absoluto a liberdade de expressão de cada um, de forma a manter a harmonia, o equilíbrio e a fraternidade e assim fazer cumprir o 6º Landmark, "A Maçonaria impõe a todos os seus membros o respeito das opiniões e crenças de cada um. Ela proíbe-lhes no seu seio toda a discussão ou controvérsia, política ou religiosa. Ela é ainda um centro permanente de união fraterna, onde reinam a tolerante e frutuosa harmonia entre os homens, que sem ela seriam estranhos uns aos outros."
Pode, nesta perspetiva, dizer-se que o silêncio e o "saber calar "são virtudes que a Maçonaria muito preza independentemente do grau e qualidade do Maçom e que a lei do silêncio nada mais é do que um perpétuo exercício do pensamento.
ELBF24

2 comentários: